Ana Ribeiro, docente da ESAS desenvolve produto inovador para o setor alimentar

Docente e Investigadora na ESAS, do IPSantarém, nas Unidades Curriculares ligadas à Tecnologia dos Alimentos (carne, leite, vinhos, entre outras), Análise Sensorial e Desenvolvimento de Novos Produtos Alimentares, criou recentemente um produto diferenciado e inovador no setor alimentar, cujo produto primário tem por base a Corvina de aquacultura. Quais foram as preocupações principais na investigação e desenvolvimento deste produto? Como obteve o produto final/que tecnologias foram utilizadas?

As preocupações principais na investigação e desenvolvimento deste produto foram inicialmente económicas pois o doutoramento foi realizado sem bolsa. Porém, a Escola Superior Agrária de Santarém e o IPMA (Instituto Português do Mar e da Atmosfera), onde decorreu o desenvolvimento deste produto, apoiaram esta investigação e contribuíram fortemente para a sua concretização. A estas duas instituições, uma vez mais, fica registado o meu agradecimento.

Em relação ao desenvolvimento do produto, a preocupação principal foi a de se obter um produto alimentar à base de polpa de peixe, apetecível ao consumidor e com interesse para a indústria. Em relação a este aspeto, a investigação direcionou-se para que num futuro próximo houvesse um melhor aproveitamento de espécies desvalorizadas e de proteína desperdiçada nas linhas de filetagem, entre outros.

O desafio no desenvolvimento deste produto foi procurar obter fiambre de pescado, com as características do típico fiambre de porco. A estrutura e a bioquímica do músculo de peixe são diferentes da do músculo de mamíferos e aves, apresentando um comportamento reológico diferente. Consequentemente, devido ao comportamento da matriz proteica ao formar géis, os fiambres de pescado tiveram de ser processados de modo diferente. Com este estudo também se pretendeu perceber quais as espécies mais adequadas para obtenção de fiambre, o comportamento de diferentes ingredientes e observar os efeitos de diferentes tecnologias de gelificação.

A realização prática decorreu inteiramente no Departamento do Mar e Recursos Marinhos (DMRM), do IPMA, em Algés. As três espécies de peixe, dourada, robalo e corvina, foram gentilmente cedidas pela Estação Piloto de Piscicultura do IPMA de Olhão (divisão de Aquacultura e Valorização). Os restantes ingredientes e outros auxiliares tecnológicos foram fornecidos pelo IPMA, ESAS e pela empresa Induxtria De Suministros Portuguesa, Lda.

A tecnologia de obtenção dos fiambres, em modo muito resumido, iniciou-se pela obtenção das polpas de pescado, no IPMA, com o auxílio de um separador mecânico. Posteriormente, misturou-se a polpa de peixe com outros ingredientes. Imediatamente após a sua homogeneização, com uma enchedora hidráulica, injetou-se a mistura em tripa não comestível. Por fim, os fiambres foram submetidos a um tratamento térmico conferindo-lhes uma pasteurização.

Com preocupações cada vez maiores por parte do cidadão comum na qualidade nutricional dos produtos e na própria sustentabilidade alimentar como espera que o “seu” produto seja recebido na indústria alimentar numa 1º fase e posteriormente no consumidor final?

Deverão ser realizados estudos de mercado e cálculos de custos de produção para se ter uma ideia mais concreta quanto ao êxito de vendas de este tipo de produto.

Todavia, sabe-se que atualmente há cinco grandes tendências de consumo que estão a redefinir os hábitos alimentares do consumidor português: “smart shopping”, saúde e bem-estar, confiança, conveniência e experiência. O novo contexto de consumo deve ser encarado pelas empresas como uma oportunidade de diferenciação e reposicionamento.

O fiambre de peixe parece-nos ser um produto alimentar que por reunir estas cinco “condições” satisfaz o atual consumidor. Em particular, poderá apresentar preços compatíveis com a capacidade de poupança dos consumidores, considerando-se uma compra inteligente. É um produto com vários benefícios para a saúde, garantindo uma maior qualidade de vida, sem comprometer o prazer de comer. O facto de se poder usar espécies de aquacultura, valoriza a responsabilidade social e ambiental da empresa fornecedora do produto, com garantia da permanência sustentável do planeta e da comunidade. A conveniência é inerente ao fiambre de peixe, pois pode ser colocado à venda em grandes superfícies e em mercearias de bairro, podendo o consumidor obtê-lo sem grande esforço e consumir o mais rapidamente possível.

A geração “Millennials” ou geração Y, atualmente com idades compreendidas entre os 23 e os 39 anos, em 2025 representarão em termos globais 75 % do total da força de trabalho mundial. É esta a geração mais influente no consumo nos próximos anos e para a qual a alimentação é fortemente valorizada. Independentemente do género, 60 % diz gostar de experimentar comidas diferentes e que o étnico está na moda.

Como vê a indústria alimentar dentro de 30 anos com o contínuo aumento da população e uma cada vez maior preocupação com o tema da sustentabilidade dos agroecossistemas, ambiente e territórios?

O contínuo aumento da população e a alteração nos seus hábitos alimentares já é, atualmente, um grande desafio para a indústria alimentar. Sabe-se que é urgente intensificar práticas mais sustentáveis em todos os sistemas alimentares, desde a produção primária até ao consumidor. Contudo, a sustentabilidade só é viável na presença de uma governação mais eficaz e justa e que possibilite o devido equilíbrio entre as iniciativas de todos os seus intervenientes.

Atualmente, em muitas indústrias alimentares já se verifica um esforço para uma atuação mais sustentável. Entre muitos outros esforços, verifica-se uma crescente exigência na aquisição de matérias-primas, privilegiando as obtidas em sistemas de produção mais adequados. Também a nível de produção, há cada vez mais uma maior preocupação pela gestão dos recursos, nomeadamente energético e utilização da água, redução dos resíduos ou até a sua eliminação.

 Como espera que o IPSantarém (onde atualmente exerce a docência) se posicione no tema da Investigação?

O IPSantarém apresenta uma postura positiva e estimulante quanto à investigação praticada nas suas unidades orgânicas. No entanto, na atualidade, o tempo dedicado à docência e outras responsabilidades inerentes à minha atividade na Escola Superior Agrária, não têm permitido a realização de outros projetos de investigação científica.

Partilhar: